quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

A Geração Mimimi

Certa vez, um tio meu (irmão de meu padrasto) disse, numa dessas reuniões familiares típicas, que hoje em dia as coisas estão mais difíceis para nós. De maneira literal, ele disse que “hoje não se pode mais fazer qualquer piada que já vem um metido a ofendidinho fazendo mimimi” (sic). Ao meu caro leitor, que leu o título desse texto e acreditou que eu discorreria sobre o tema na mesma perspectiva de meu tio, devo dizer que provavelmente irá se decepcionar lendo os próximos parágrafos. Isso porque irei exatamente ao caminho contrário, e defenderei aqueles (ou uma grande parcela daqueles) que são peritos na arte de fazer mimimi.
Dessa forma, quero trazer uma situação que talvez ilustre melhor esse caso. Recentemente, Renato Aragão, um humorista muito famoso no Brasil, disse que antigamente os negros e os gays não se ofendiam com as piadas sobre negros e gays. Inclusive, o Mussum, personagem da turma dos Trapalhões, já foi um alvo fácil das piadas racistas da turma. O que Renato Aragão disse é, de fato, verdade, e se aproxima muito do comentário que meu tio fez. Mas como diria uma professora minha da faculdade, não só de fatos vive o homem, mas de todas as interpretações e significações que acompanham tais fatos. Ou seja, tal verdade deveria vir em tom de elogio e esperança de que algo está melhorando. Mas não é bem assim que ocorre. Quando tais fatos são ditos, é em tom de crítica que ocorre. Num tom de algo que mudou, mas não deveria ter mudado.
Mas afinal, o que vem a ser um mimimi? Dentro da minha capacidade limitada de interpretação, entendo o mimimi primeiro como uma onomatopéia que visa imitar um choro próprio de crianças pequenas. Mas não qualquer choro. Não é o choro de fome, de sede, de tristeza, de abandono ou de fralda suja que a ideia de mimimi busca se aproximar. É do choro próprio de crianças que se convencionou chamar de “birrentas”, ou seja, crianças que forçam determinado choro para buscar ter algo que não é necessário a elas, um choro que visa um fim totalmente fútil (essa palavra não será mais repetida no texto, mas acho importante guardá-la na memória). Já ficou claro que, como onomatopéia, o mimimi não é nem um pouco parecido topograficamente com o choro de crianças “birrentas”. Mas, por algum motivo que desconheço, é o mais próximo desse choro.
Ora, entendendo o mimimi dessa forma, resta falar a quem ele é geralmente “dado de presente”. Forçando a memória, lembro que o mimimi já era uma palavra usada quando eu era criança, e descrevia (obviamente) todas às vezes em que eu fazia “birra” (sim, eu já fiz muita birra). Mas hoje em dia eu praticamente desconheço pessoas que usam essa palavra em situações como essa. Talvez seja devido à minha experiência limitada, mas eu sinceramente desconheço. Ao contrário, tal frase é geralmente usada com pessoas grandes já, mas pessoas que desejamos na verdade tomar como verdadeiros bebezões.
Assim, nos dias de hoje, numa associação grotesca e perversa, passamos a utilizar o mimimi como forma de desqualificar a opinião do outro, subentendendo que esse outro é um verdadeiro “bebezão birrento”. Ora, quem dá atenção a uma criança birrenta? Geralmente quando tal atenção é dada, é na forma de espanto e recriminação, como um pai ou uma tia que diz apenas com o olhar “Que coisa feia, guri! Pare com isso agora!”. Ninguém tenta conversar com o bebê birrento e entender o que ele quer e porque o quer. Seguindo essa linha de raciocínio, dizer que o outro está fazendo mimimi é uma forma de dizer que ele certamente é uma criança, alguém imaturo e portanto, alguém com o qual não devemos dar o prazer de um diálogo. E no fundo, o mimimi é isso mesmo: uma tentativa de acabar com o diálogo e calar a boca desse outro com quem estamos falando.
Como um internauta inveterado, já não consigo passar meus dias sem navegar na internet. Seja por diversão, seja por informação, é quase certo que uma hora eu estarei lá durante o dia. E quase como uma regra, notei nesse espaço que o mimimi é sempre usado para descrever as palavras de pessoas que reclamam contra algum tipo de preconceito (racismo, homofobia, machismo, transfobia, etc.). Lembro inclusive, nas minhas primeiras aventuras pela internet, que tal palavra era usada para nomear reclamações contra preconceitos tão naturalizados, que pareciam normais. Um exemplo ainda vívido em minha memória foi a de um rapaz que disse para uma moça parar de fazer mimimi, isso porque ela estava reclamando, nos comentários de um texto feminista, sobre o fato dela e sua mãe ainda serem as únicas responsáveis pelos afazeres domésticos numa casa com mais três homens.
Apesar e absurdo (pelo menos absurdo a quem, como eu, ama fazer um mimimi), essa situação era, e talvez ainda seja, bastante naturalizada no nosso cotidiano, e mesmo que de maneira forçada, é fácil para nós entendermos porque grande parte das pessoas entendem as reclamações sobre preconceitos naturalizados como um verdadeiro mimimi. Agora o que eu realmente não aceito como algo naturalizado é a violência física (1), mesmo quando ela é direcionada a grupos historicamente marginalizados.
Digo isso para que fique mais claro o espanto com que eu fiquei ao ver no facebook, ano passado, os comentários abaixo de uma notícia (publicada pela Folha de S. Paulo) sobre um jovem gay que foi agredido justamente por ser gay. Bom, se já não bastasse a notícia em si ser triste, os comentários eram ainda mais horríveis. Infelizmente não tenho tal notícia em mãos, mas ainda guardo o horror com que fiquei ao ler um comentário que um homem fez em resposta as palavras de um jovem gay que se solidarizou com o caso. Em resumo, o homem disse para esses gays pararem de mimimi, pois se andassem que nem homem na rua, isso não teria acontecido. O show de horrores continuou quando vários comentários de apoio surgiram não ao jovem gay que se identificou com a notícia, mas com o homem que “teria falado nada mais do que a verdade”.
Por isso, parei de por um tempo de ver com bons olhos aqueles que tinham como argumento principal a famosa frase “pare com mimimi!”. Sei que parece paranóia minha, mas passei a ver tais pessoas como o tipo de gente com o qual é impossível travar um diálogo de diferente para diferente (afinal, diálogo de igual pra igual é fácil). São pessoas que descobriram uma forma sutil, mas igualmente violenta de calar qualquer um que pensa diferente e anseia pela quebra de um determinado status quo.
Na minha curta experiência, cansei de ouvir minhas palavras serem rotuladas como mimimi, como algo próprio de uma criança birrenta que, justamente por ser criança, não é passível de entender aquilo que os adultos, e portanto mais maduros, entendem perfeitamente sobre a vida. Para o bem ou para o mal, isso me ensinou a mais ouvir do que falar.
De qualquer forma, já aprendi a aceitar o fato de faço parte de um seleto grupo que tomo aqui a liberdade de nomear como a geração mimimi. E talvez como um alívio de espírito, ou uma luta realmente válida, proponho um novo entendimento desse termo. Em vez de uma palavra que rotule pessoas que não são dignas de participarem de um diálogo com pessoas que entenderiam de forma definitiva a realidade, prefiro imaginar agora o mimimi como uma palavra que nomeie ações de pessoas que negam se calar diante de atrocidades, muitas delas simbólicas e naturalizadas, outras mais físicas e violentas.Uma geração que cansou de servir de piada àqueles que hoje “já não podem fazer piada com preto, índio, gay, mulher e travesti”. Uma geração que diz aquilo que muitos não querem ouvir e não se importam em serem a ovelha negra (ou colorida) do trabalho, da família, da faculdade e de qualquer outro espaço.
Proponho essa mudança de interpretação porque sei o quanto tal palavra consegue calar as pessoas, ofender quem já se sentia ofendido e desqualificar quem já é desqualificado no cotidiano. Mas proponho além de todas essas novas interpretações, pelo menos mais uma: a geração mimimi como a geração da paciência. Mas por quê? Pelo simples fato de que poucas pessoas sabem o quanto é difícil dialogar com gente que em vez de debater ideias, agride seu interlocutor (seja de forma física ou simbólica). Ora, defender uma sociedade mais justa é muita difícil nessas condições! Só tendo muita paciência e fazendo muito mimimi mesmo!


OBS:
1. Por favor, não entendam aqui que eu acho natural a violência simbólica. Para mim, naturalizado não é o mesmo que natural. Além disso, natural não é algo que eu acredite que seja um valor acima de todos os outros.

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Resenha – O Pequeno Príncipe

"Foi o tempo que dedicaste à tua rosa que a fez tão importante"
A resenha de hoje contemplará o clássico de Antoine de Saint-Exupéry: O Pequeno Príncipe (Le Petit Prince). Pode parecer redundância postar um texto que se auto-intitula como “resenha” sobre esse clássico, mas é quase impossível se calar após a leitura desse livro. Devo dizer, no entanto, que tal resenha só foi feita depois de uma longa digestão desse livro, e só agora tomei coragem em escrever algo sobre.
Publicado nos Estados Unidos pela primeira vez em 1943, O Pequeno Príncipe narra em primeira pessoa as experiências de um aviador preso no deserto após um acidente em seu avião. Nesse meio tempo, o aviador conhece um garoto de cabelos loiros como a cor do trigo e que diz vim de um planeta onde ele é o único habitante.
Apesar da aparência de livro infantil, o livro chama atenção pelos profundos questionamentos sobre coisas próprias do mundo dos adultos. Seus personagens podem ser considerados como caricaturas de “tipos psicológicos” muito comuns no mundo em que vivemos, e talvez aí resida a atualidade de O Pequeno Príncipe.

A escrita do livro é feita de modo muito singelo, quase infantil realmente, e talvez esse fato tenha permitido com que as reflexões de Antoine de Saint-Exupéry fossem absorvidas tão facilmente pelo público. “Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas” é a frase mais popular do livro, e retrata de forma muito simples a angustia do adulto moderno (ou pós-moderno) que gostaria muito de retornar à vida infantil, mas se encontra incapacitado por sua realidade. Uma realidade que, além de impedir ele de realizar seu sonho, o obriga a viver como eterno “acendedor de lampião” e a conviver com “reis”, “homens vaidosos” e “empresários”. 


Nando Reis

Iniciarei hoje uma série de textos que abarcarão músicos, compositores e/ou grupos musicais que muito me agradam e me inspiram de alguma forma. Mas pra quê isso? Bom, como tudo nesse blog, esse texto não vai servir para você em nada (eu acho). No entanto, servirá para mim, e muito, pois notei que sou o pior fã ou apreciador da arte musical que pode existir ou já existiu na terra: eu simplesmente não sei nada sobre aqueles que eu admiro e ouço muito! E isso é muito triste, pois não sirvo nem para defender meus gostos musicais...
Lamentos a parte, resta dizer o que eu vou necessariamente abarcar nesses textos. Dessa forma, me planejei em trazer pelo menos as seguintes informações: (1) a história do músico, compositor e/ou grupos musical tratado; (2) o gênero a qual pertence e (3) algumas das músicas que mais gosto (um mínimo de 5 músicas). E assim, sem mais delongas, iniciarei essa série de textos com um cantor que eu gosto muito: Nando Reis.


José Fernando Gomes dos Reis (nome de batismo o cantor) é natural de São Paulo e nasceu em 12 de janeiro 1963. A carreira musical de Nando Reis despontou desde a infância, quando este tocava seu violão e já começava a compor suas primeiras músicas.
A maior parte de sua história (20 anos de sua vida) foi como baixista da banda Titãs, e lá compôs diversas músicas que o tornaram famoso, entre elas "Querem Meu Sangue, "Os Cegos do Castelo" e "Pra Dizer Adeus". Em 1995, Nando Reis iniciou sua carreira solo, e desde então, criou vários sucessos que em minha opinião já podem ser considerados “clássicos”. Vale a pena citar aqui as músicas compostas por Nando Reis e cantadas por Cássia Eller: "Diariamente", "All Star", "O Segundo Sol" e "Relicário”.
Atualmente, Nando Reis virou notícia ao ser indicado ao Grammy Latino de Melhor Álbum de Rock Brasileiro em 2014 graças ao seu álbum “Sei Como Foi em BH”.

TOP 5
5 – Mantra
Sabe aquele momento em que você está cansado de toda a cultura ocidental e quer algo um pouco mais “oriental”? Pois bem, se você sente falta desses momentos, sugiro que ouça essa música. “Hare Rama Hare Rama Rama Rama Hare Hare”


4 – Um Simples Abraço
Essa é para aqueles que, quando amam, acreditam que “o mundo não precisa nunca mais girar”. É uma música calma, simples e muito gostosa de ouvir.


3 – O Segundo Sol
Pode ser redundante, mas essa música “não tem explicação”. É algo que não ouso interpretar, apenas escutar e apreciar gente que sabe ser poeta, como o Nando Reis.


2 – Por Onde Andei
Essa música me conquistou por causa de um único trecho: “Que a vida é mesmo/Coisa muito frágil/Uma bobagem/Uma irrelevância/Diante da eternidade/Do amor de quem se ama”. Depois disso, não consegui deixar de apreciar essa obra.


1 – All Star Azul
Em primeiro lugar, coloco a música que me fez conhecer Nando Reis e nunca mais largá-lo. Acho que essa música acende certos desejos secretos meus, como a parte que diz “E continuar aquela conversa que não terminamos ontem”.


Fontes:

Encontro na sessão de hortifrutigranjeiros

Aquele foi um dia diferente para Lucas. Acostumado a sair de casa ao som de Mozart, Louis Armstrong ou Nando Reis, Lucas decidiu escutar com seus fones de ouvido os Beatles quando foi ao supermercado comprar seu pão e um chinelo (afinal, o seu antigo havia arrebentado, para a alegria de Lucas...). Quando estava escutando Twist And Shout, Lucas se sentiu o mais rebelde dos seres. Irônico isso, pois Tadeu, após uma breve surpresa, notou que Lucas ainda era exatamente o mesmo: um magrelo introvertido de olhos grandes, cabelos castanhos desgrenhados e um certo ar de arrogância.
Quando uma nova música começou, Lucas saiu de seu transe introvertido e notou uma figura que o estava cuidando discretamente. “Olhando sem olhar”, ato esse realizado por Lucas com maestria graças aos seus olhos avantajados, ele notou a familiaridade presente naquela figura curiosa e, quase que instantaneamente, um frio lhe subiu às espinhas. Quem diria que logo ali, na sessão de hortifrutigranjeiros (“Que diabos eu tô fazendo aqui?!?”), Lucas teria um deja vu de todos os bons e maus momentos que passou há um ano e seis meses atrás... Obviamente Lucas (e Tadeu também) fizeram o que qualquer pessoa madura e bem resolvida faria numa situação dessas: fingiram que não viram um ao outro. Mas a curiosidade era maior do que a ansiedade, e ambos decidiram continuar se observando discretamente.Uma encenação muito interessante, pois apesar de ambos os personagens saberem exatamente o que está acontecendo no palco, faz parte do script buscarem acreditar que não foram e nem serão notados.
Lucas não conseguiu dizer a si mesmo o que em Tadeu estava diferente. O mesmo cavanhaque, a mesma barriguinha conquistada com muito esforço a cada final de semana nos bares da cidade, os mesmos cabelos castanhos despenteados, o mesmo olhar inocente. Ah, é isso! A roupa era nova! Uma calça jeans escura, um tênis marrom novo (“Que feio!”, Lucas pensou) e uma camiseta dos Ramones. Lucas notou também que Tadeu estava “aparentemente” distraído perto da sessão de biscoitos. “Talvez não tenha mudado tanto assim”, pensou. Cansado de analisar tomates (“Agora é sério! Não era para eu estar na sessão de chinelos?”), Lucas decide que é hora de fazer o que deveria ter feito há muito tempo: comprar seus chinelos. Esperava que tivessem menos modelos coloridos, pois da última vez teve que comprar um chinelo vermelho, pois só havia essa cor...
- Lucas?
Dois segundos. Os dois segundos mais longos da vida de Lucas. Sua respiração parou, seu coração parou, sua perna parou. Enfim, o mundo parece ter parado por dois segundos. Tempo mais que suficiente para Tadeu notar o efeito que ainda causava naquele rapaz estranho. Mas se Lucas tivesse parado de reparar apenas na sua reação e notasse mais as reações do ser que lhe paralisou, talvez tivesse notado que a ansiedade era mútua, num grau em que era difícil avaliar quem estava mais desconfortável.
- Olha só! Olá! – disse Lucas, se virando e fingindo surpresa.
- Te vi faz um tempo, e achei que você ia ir embora sem nem me cumprimentar – disse Tadeu, encenando uma falsa preocupação. Falsa nada! O que ele queria era esconder sua preocupação verdadeira demonstrando ela como se fosse uma encenação. Eu sei, é confuso. Humanos são confusos!
- Fones de ouvido... – disse Lucas, já tirando eles do ouvido e já nem se dando conta de qual música estava escutando esse tempo todo – Sabe como é. Fico “fora do ar” quando coloco meu fone...
- Sei bem como é. Também sou desses! – afirmou Tadeu, forçando um riso muito cômico – E então, é aqui que você vem sempre?
- Só às vezes, quando preciso comprar muita coisa ou coisas caras. O mercado perto de casa tem uns preços nada legais. Só dá para comprar uma coisa ou outra...
“Para!”, pensou Lucas. Ele bem sabia o quanto ficava falante cada vez que estava nervoso. E Tadeu sabia disso. Sim, certamente aquele era um momento para não demonstrar nervosismo. Tadeu estava num misto de completo desconforto com a fascinação típica de quem se depara com uma obra de arte muito bela. É engraçado que, apesar de todos os esforços da sociedade, a máxima “quem ama o feio, bonito lhe parece” ainda impera nas situações mais cotidianas.
- Mas e você – continuou Lucas – Também vem sempre aqui?
- Na verdade não. Fiquei de passar na casa de uma amiga que mora aqui perto e pensei em levar algo pra comer – disse Tadeu apontando para um pacote de bolacha que, por ironia do destino, não estava em suas mãos.
- É, acho que você esqueceu de pegar – comentou Lucas e rindo tal qual uma criança. Desnecessário dizer o quanto Tadeu ficou vermelho.
- Pois é... Impossível alguém acreditar que eu não uso maconha quando faço essas coisas – se explicou Tadeu, forçando mais uma vez, seu riso cômico.
Lucas bem sabia que tal “brincadeira” tinha seu “fundo de verdade”, pois ele lembrava bem dos devaneios super fantasiosos que Tadeu tinha e dividia de vez em quando. Nesse ponto, Lucas era um conservador enrustido: dizia a todos que era algo que julgava como natural, mas guardava certa repugnância em seu íntimo. Tais fatos permitem dizer, voltando aqui ao tempo presente dessa história, que Lucas não riu muito da piada de Tadeu, e isso não passou despercebido a este:
- Você ainda é o mesmo... – disse Tadeu, com certo sofrimento em seu tom de voz.
- E você também não mudou muito. Talvez as olheiras, mas de resto, ainda é o mesmo – respondeu Lucas, forçando novamente uma piada. Mas o momento já não era mais de piadas mútuas.
- Eu ainda sinto falta de você, apesar de tudo – declarou Tadeu, sem conseguir esconder os olhos que começavam a marejar.
- Nós dois sabemos que nada de bom pode sair de uma conversa como essa, Tadeu...
- Olha aí! – disse Tadeu, cortando a fala de Lucas – Finalmente falou meu nome. Pensei até que tinha esquecido de mim.
- Eu e você sabemos bem que é praticamente impossível a gente esquecer um do outro. Mas eu não quero mais me iludir. E acho que não foi bom a gente conversar de novo...
- Também, você fez questão de me bloquear no facebook...
- E você queria o que? Que a gente voltasse a se falar normalmente? Fingisse que somos bons amigos? Esquecer que você terminou comigo com uma simples mensagem por celular e depois sumiu por dias, sem me explicar o que aconteceu? – desabafou Lucas de forma que, apesar de manter um tom de voz baixo, demonstrava uma grande raiva reprimida.
- É... Parece que eu sou mesmo o vilão da história. Sei que errei, e queria muito poder explicar, mas só acho que eu não sou o único culpado.
- Não sei se você precisa explicar alguma coisa. Você é medroso, e sempre teve medo de assumir algo comigo. Logo quando eu já estava super ansioso em mostrar pra todo mundo o quanto te amo. Mostrar que eu também sou capaz de amar...
- Acho que não tem mais o que falar mesmo. Você ainda é muito voltado pro seu umbigo, e não dá o tempo que as pessoas precisam. Talvez seus amigos estejam certos e você não seja mesmo capaz de amar alguém. – disse Tadeu, que sem se despedir, deixou Lucas sozinho na sessão de hortifrutigranjeiros.
Ao sair para fora, Tadeu lembrou que não havia pegado o pacote de bolachinha (ou será biscoitos?) que tinha ido comprar, mas por motivos óbvios, decidiu seguir caminho, pensando no quanto foi idiota mais uma vez. Enquanto isso, Lucas se viu mais uma vez olhando para os tomates, e em especial para o que segurou durante toda a conversa, e notou que ele estava muito mais amassado que os demais. Decidiu esperar mais uns dois minutos, pois acreditava que ainda poderia encontrar Tadeu na rua, e após esse tempo, saiu do supermercado, sem olhar para ninguém e pensando no quando foi idiota mais uma vez.
Esse não foi mesmo um bom dia para Lucas, pois além de ficar com fome por não ter comprado o pão, passou o dia descalço, pois fez o favor de também esquecer seus chinelos novos. Logo ele, que odiava andar de pés de descalços...



Nota: Após um longo tempo, voltei ao blog e prometo escrever mais textos. Pelo menos dessa vez, tempo não me faltará, pois estou desempregado (sim, eu finalmente me formei!). E esse conto faz parte de um projeto pessoal que visa treinar minha capacidade de contar histórias. Sei que o conto está confuso e mal escrito, mas por favor, relevem! Não me lembro a última vez que escrevi uma história fictícia e, usando um termo bem mentalista, achei que estava na hora de tirar da cabeça as milhões de histórias que rondam minha imaginação. Como podem notar, já sei usar a hipérbole. Espero usar com moderação nos próximos contos!