segunda-feira, 30 de setembro de 2013

A Amizade: para além dos laços familiares e do coleguismo

Sempre tive um certo desdém às regras, mas desde cedo percebi que é algo inútil lutar contra todas elas. Regras estão presentes na nossa vida desde nossa concepção até a morte. É preciso que um óvulo e um espermatozoide se unam para que surja um humano. É obrigatória a estadia de alguns meses no ventre materno até que estejamos aptos a viver no ambiente natural. É regra respirarmos oxigênio sem cessar. É lei natural que nos alimentemos rotineiramente. É obrigação nossa morrer depois de certo tempo. Viver a regra parece ser a máxima que reúne os seres vivos e não vivos.
A regra em si não é boa nem má a priori, ela apenas tem suas razões (nem sempre tão explícitas) para existir. Mas, se idealizarmos um ser que apenas observa o mundo e toda a realidade como um mero expectador totalmente fora dela, talvez ele imaginasse que o ser humano não criaria mais (tantas) regras para si depois de tais obrigatoriedades impostas naturalmente. Porém, não foi o que ocorreu. A obrigação de viver em grupos impôs a necessidade da criação de regras de convivência que possibilitassem, naquele momento, a segurança e sobrevivência individual.
O tiro, no entanto, saiu pela culatra. Tais regras de convivência se tornaram cada vez mais complexas a ponto de perder a sua razão de existência e a sua funcionalidade inicial. Não falamos mais o “bom dia” como forma de desejar que o outro, como membro do meu bando, tenha um dia bom, visto que qualquer ameaça ao “dia bom” a um membro do meu bando é uma ameaça direta a mim. Desejamos o bom dia por pura e simples obrigação. Também não elogiamos o outro por que a vitória dele exercerá um impacto direto no meu bando, mas sim por que faz parte das novas regras de competição demonstrar esse tipo de superioridade ilusória (“sou tão superior a você, que sua vitória não me abala nem um pouco”).
Temos também as regras de amor familiar. Hoje em dia é inconcebível imaginar uma mãe que não ame um filho, mesmo que a regra natural da vida demonstre que, em outros animais, a mãe destrate o filho e o expulse de seu ninho após certo tempo. Por isso penso que laços familiares são, hoje, muito mais uma convenção imposta do que uma união verdadeira entre pessoas que se amam. “Quer dizer então que membros familiares na verdade não se amam?”. Ora, regras de convivência, mesmo quando forçadas, não impedem o surgimento de laços afetivos. Dois irmãos, obrigados a viver no mesmo teto, podem sim ser grandes confidentes um do outro. Ou seja, mesmo que a regra “ame a todos de sua família” seja uma obrigação existente antes mesmo do afeto recíproco entre familiares, isso não impede que eles criem um laço afetivo genuíno.
E é nesse contexto que eu admiro a amizade, quando esta é autêntica. Não existem as regras “Tenha um amigo!” ou “Mantenha um amigo dessa forma!”. Somos amigos de alguém por que assim desejamos e mantemos uma amizade por que queremos. A amizade representa, talvez, algo de mais humano que possa existir no ser-humano. Ou melhor, algo de mais libertário que possa existir no ideal de liberdade.
Como já deixei implícito, é inadmissível que a Mãe Joana não ame o Filho Joãozinho. Menos assustador, mas ainda digno de estranheza é o fato do Pai João não amar o Filho Joãozinho, ou que o Irmão Pedrinho não goste de ficar perto do Irmão Joãozinho. Ser pai, mãe, avós, irmãos, tios e sobrinhos não é algo que reside no âmbito da escolha. As vezes nós aceitamos com alegria tais funções, outras vezes apenas nos resignamos com essas nomenclaturas e suas obrigatoriedades. Mas a amizade não. João não é obrigado a ser amigo de José, e nem tampouco a manter, depois de iniciada, essa amizade para o resto de sua vida. Se um dia eles se tornarem amigos, isso ocorrerá por simples escolha de ambos.
Confundimos, quando tentamos conceituar, coleguismo com amizade. O coleguismo surge da união forçada entre pessoas. Pode surgir no ambiente de trabalho, na sala de aula ou qualquer outro espaço onde a interação não ocorre com familiares. Como a necessidade de socialização é uma regra, o coleguismo torna-se uma regra conseqüente. Mas isso também não impede o surgimento da amizade.
E é por isso que, diante de tudo isso, não pude deixar de notar essa relação tão especial que pode surgir entre duas ou mais pessoas, algo que demonstra a vontade sempre presente de sermos livres. Sim, por que amizade é liberdade. Liberdade de ir e vir COM ou SEM o amigo. Liberdade de não dar satisfações, mas também a liberdade de dar satisfações. Até a linguagem, cheia de regras de semântica, perdem o seu valor no meio do ambiente amistoso. Ou seja, temos a liberdade de xingar, com a certeza de que o xingamento é muito mais um elogio do que uma ofensa naquele momento específico. Um espaço onde um “filho da puta”, ou um “idiota” mesmo, perdem seu sentido original e ganham um sentido de acordo com a vontade dos membros daquele grupo amistoso é algo sensacional! Quer uma liberdade maior que essa, de poder brincar com as palavras de forma despreocupada e despretensiosa? Não, não há. Aliás, tal liberdade não se admite de forma algumas em outras formas de interação e agrupamento social.
Parece milagre que, em um mundo cheio de regras tal liberdade ainda exista. Talvez seja o contra-controle (by Sidman), sempre presente diante de sinais claros de coerção. Não importa. O que importa hoje é a prioridade que dou a certas funções. Me permiti ser muito mais amigo da minha mãe do que filho. Tento me permitir ser mais amigo dos meus avós do que neto. Quero ser mais amigo dos meus amigos do que colega. Se essa é a única escolha que poderei fazer num mundo sedento de obrigatoriedades (ora naturais, ora convencionais), que assim seja.

Mas é melhor tomar cuidado. Liberdade diz respeito a responsabilidades, na medida em que você escolhe seus atos. É por isso que a pergunta “por que você ama seu filho” gera incompreensão, pois não posso justificar um ato que não depende de sua escolha. Mas rotineiramente a pergunta “por que você ama seu amigo” pode surgir, e a partir de então, você não mais terá as regras sociais como bode expiatório. E então, eu te pergunto: por que você ama seu amigo? Caso não consiga responder (ou ache a pergunta uma palhaçada), receio que não estamos mais falando de um amigo seu, mas de um mero familiar, ou pior, um simples colega...

terça-feira, 17 de setembro de 2013

Entre a Bondade e a Maldade: o drama dos que querem apenas ser humanos...


Que bondade e maldade são adjetivos que modificam suas características com o passar dos tempos, isso todo mundo sabe. Logo, não é novidade nenhuma o fato de que o que é considerado “bom” e “mau” hoje em dia (em relação à moral humana) é diferente daquilo que era moralmente bom ou mau há 50 ou 80 anos atrás.
Desde que Jesus ditou as regras do que viria a ser o Novo Testamento, ser “bom” e ser “mau” são os critérios primários de classificação moral dos seres humanos. Para esclarecer, quando digo que foi a partir do Novo Testamento o estabelecimento definitivo desses critérios, falo em termos de manifestação das massas: é o cristianismo/catolicismo (e sua vertente mais atual, o protestantismo), e não o judaísmo (baseado no Antigo Testamento), que estabelece na sociedade atual normas de funcionamento na esfera privada e moral. No entanto, mesmo com códigos morais escritos há milhares de anos, é fato que bondade e maldade se modificaram muito.
Ou seja, os tempos mudam, as formas de relacionamento mudam, mas os adjetivos continuam os mesmos: ou somos bons, ou somos maus. Essa semana li um artigo de Pondé, onde ele declara que a cultura judaico-cristã estabeleceu as raízes do que viria a ser a Psicologia. Isso por que é graças a ela que ficamos capazes de nos auto-conhecer, auto-investigar, priorizar causas e razões internas. Mas é óbvio que para descrever algo, precisamos conceituar antes. E o dualismo aqui tomou as rédeas.
Mas nem sempre focamos tanto a moral humana e suas causas mais profundas. Basta olhamos a cultura grega, que até hoje influencia nossa forma de política (termo esse cunhado por eles). Com raras exceções, como Sócrates (e sua célebre frase “conhece-te a ti mesmo”), a filosofia grega quase sempre priorizou a vida pública. Uma prova disso é que, antes mesmo de investigar o que é Bom e o que é Mau, os Gregos buscaram saber o que é a Verdade, conceito fundamental para a retórica e para a vida pública.
A Bondade e a Maldade, no entanto, não necessitam de investigações, visto que suas definições encontram-se no âmbito das emoções, e não da razão. Como sugere Pondé no artigo que li, nem é preciso que tais conceitos passem pela razão, pois já há uma entidade sobrenatural (Deus) que serve de modelo e de juiz que dita o que é bom.
Colocações a parte, é inegável que nós sempre tentamos nos qualificar em uma das categorizações. A literatura, por si só, trata de perpetuar essa forma de visão. Deixando minha veia mais nerd falar, o seriado Game of Thrones (baseado no livro “As Crônicas de Gelo e Fogo”), é uma das poucas obras que desmistifica esse dualismo. Lógico que não totalmente, visto que sua intenção é imitar relações humanas reais dentro de um contexto específico, e como nas relações automaticamente nos categorizamos, é óbvio que o dualismo é presente nessa obra, mesmo que de forma menos intensa. Basta averiguar o personagem de Ned Stark, que ganhou o título de mocinho numa obra que buscou de todas as formas abolir os conceitos de mocinho e vilão.

Como bem sabemos, a vida inteira somos postos a agir e pensar da partir desses dois parâmetros, seja pelas relações sociais concretas, seja pelas obras literárias, seja pela cultura. É um dualismo pouco flexível, ao mesmo tempo que inconstante. Um verdadeiro filme de terror para quem teme categorizações, mas não consegue fugir delas. Diante disso, é que fico pensando: como um dia poderemos ser Humanos, se a todo o momento nos exigem uma posição ora de Anjos, ora de Demônios...


domingo, 15 de setembro de 2013

O que é diálogo? *

Diálogo é o ato de se comunicar com o outro, onde ambos os integrantes dessa ação se expressam, sem a predominância de um ou outro. Tal ação é geralmente entendida como algo que ocorre entre duas pessoas, mas ela pode ser mais do que isso. Ela pode ocorrer entre grupos e entre instituições também.
Quando entendemos o diálogo como algo que pode ocorrer entre grupos e instituições, devemos ter a sensibilidade e a não ingenuidade de saber que não pode ser considerado diálogo a imposição de ideias. Nesse sentido, o diálogo se perde por que uma hierarquia se estabelece, onde um grupo se considera como O Certo. Vale dizer que essa hierarquia estabelecida entre "ideias corretas" e "ideias erradas" é relativa, pois no caso de relações estabelecidas entre grupos, não haverá aquele que se considerará errado. Essa é a raiz de todo e qualquer obstáculo para o estabelecimento de um diálogo.


Mas o que ocorre caso uma das partes se permite abrir? O pensamento automático da maioria diria que algo mágico ocorreria, onde o estabelecimento de um diálogo genuíno ditaria as novas formas de relação. Mas não é isso que ocorre, infelizmente. Mas por que?
O porquê disso está no fato de que a ação de "se abrir para o diálogo" que uma das partes pode se propor não é o mesmo que dizer que essa parte estará jogando todas as suas ideias historicamente estabelecidas no lixo. E mais uma vez o diálogo não se estabelece, pois não basta a abertura de um único grupo para que um diálogo ocorra. Tal ação necessita do mesmo pontapé de todas as partes.
E o que dizer de um grupo que tem em seu histórico uma posição de intolerância com ideias contrárias, mas que, num momento inesperado, se permite colocar em posição de debate de ideias? A lógica os diria para aproveitar esse momento ao máximo, não? E o que dizer desse mesmo grupo caso ele tenha um poder muito grande sobre todos aqueles que lhe integram e, inclusive, sobre a sociedade em geral? A lógica diria mais uma vez para agarrar a oportunidade com unhas e dentes.
Mas infelizmente, sentimentos, ações e ideias de intolerância parte de todos os lados. Nas relações entre grupos e instituições então, tal relação de hierarquia de ideias é potencializada ao máximo! E nesse contexto, não a diálogo que possa existir. Se entendêssemos que diálogo não é o mesmo que mudança de opinião de apenas uma das partes, certamente o momento atual não demonstraria situações de intolerância de ambas (e friso bem essa parte: AMBAS) as partes...


* Texto publicado originalmente no facebook, cuja finalidade não é definir um termo, mas discutir e refletir sobre.

sábado, 7 de setembro de 2013

A Bondade dos Anjos

É muito engraçado como o apelido "anjo" age como um combustível eficaz em qualquer relacionamento. E não é para menos. Anjos são, de acordo com nossa visão pré-concebida, seres de bondade infinita, mas que ao contrário de Deus, devem carregar consigo a humildade de se autodeclararem "menos", mesmo diante de tantas qualidades que guardam em si. E esse nome, carregado por toda essa visão, é aceito com muita felicidade por quem recebe esse apelido.
O sentimento narcísico decorrente dessa nomenclatura dada é enorme, sendo que eu particularmente considero difícil existir alguém que não se satisfaça com os seguintes adjetivos introjetados em si: belo, bondoso, inteligente, humilde, perfeito...

E eis que surge a essência do sentimento gerado por esse nome: a perfeição. Porém, aqui coloco a perfeição somada com uma característica a mais, que é a humildade. Mas por quê? Deus, como já deixei implícito, não necessita ser humilde. Como “Senhor de toda a criação”, é dispensável carregar para si o adjetivo de “humilde”, cabendo a nós, meros mortais, esconder (ou nos livrarmos logo) de tudo aquilo que chamamos de “orgulho”. Em toda a mitologia cristã, é fácil reconhecer o futuro de quem ousa ser orgulhoso, característica essa que apenas Deus pode ter. Tal assunto renderia outro texto, mas o que quero colocar aqui é a dicotomia que separou homens de deuses, mas que criou um terceiro elemento, que são os anjos. Como orgulho era uma qualidade que homens não poderiam ter, o que lhes restou foi ficar com o seu equivalente negativo, que é a humildade. Humildade e nada mais, eis a única qualidade dos seres humanos.
Mas anjos são mais do que homens, e menos do que deuses. Como criar para esta classe características únicas que a distinguiria das demais? A resposta é simples: não se cria características novas; usa-se qualidades já existentes (conhecidas), mistura-as e pronto! Temos um novo ser. Mas olha a armadilha que criamos: juntamos qualidades próprias de Deus e unimos com a única qualidade que restou aos seres humanos, que é a humildade. Diante disso, ultrapassamos o nosso próprio ideal de perfeição. Por isso, não desejamos mais ser “deuses”, queremos ser os “anjos” da vida de alguém, queremos ultrapassar a própria perfeição!
Talvez seja por isso que namorados e namoradas amam declarar seus amados como os “anjos de sua vida”, pois é a forma mais sutil, eficaz e igualmente poderosa de demonstrar os sentimentos elevados que se tem por outra pessoa. Mas cuidado! Anjos são seres maravilhosos sim. No entanto, sua magnificência não é conquistada, é dada, vem de fora.
Das coisas que mais temo, a bondade natural seria certamente um dos primeiros itens, pois assim como ocorreu com um certo anjo, a raiva ao descobrir que, mesmo diante de todas as qualidades, algo “maior” está acima dessa suposta perfeição pode criar verdadeiros monstros cruéis em busca do narcisismo perdido.
Por isso, penso que é bem melhor continuar sendo um ser humano de valores ora conquistados, ora rejeitados, do que ser algo superficial, cujas qualidades são dadas e, a qualquer momento, podem transformar nossas vidas num inferno...*

*O trocadilho foi intencional

domingo, 1 de setembro de 2013

A Alegria do Fim de Semana

Via de regra, reclamamos durante os dias da semana pela chegada rápida do sábado e do domingo. Quando estes finalmente chegam, somos tomados por um sentimento de vazio que não conseguimos explicar. Como é próprio do ser-humano procurar explicações sobre o que está a sua volta (sejam elas explicações emocionais ou racionais), costumamos dizer que ficamos tristes por que "a segunda-feira está retornando".
Ainda dentro desse pensamento, é possível dizer que o único dia da semana realmente "feliz" é a sexta feira. Mas por quê? Mais uma vez, o pensamento recorrente os diz que é a sexta a anunciadora do grande momento de felicidade, que é o tão esperado Fim de Semana. E assim vivemos nossas vidas acreditando que as coisas são simples dessa forma.
Mas as coisas são, ao meu ver, mais complicadas do que parece. Se olharmos a história, notamos que é apenas na nossa época atual que o tempo parece "correr" mais do que o normal. Isso nunca antes foi visto, e para averiguar isso, basta conversar com nossos avós e demais pessoas com idade avançada, e veremos que é unânime a sensação de que o tempo corre depressa ultimamente.
Não estou dizendo nada novo, nada inovador, nada estranho. É um fato que todos parecem sentir, sem exceção. No entanto, isso muito mais tem a ver com a quantidade de afazeres que temos que administrar em apenas 24 horas, do que uma teoria maluca que diz (por exemplo) que "a Terra está girando mais depressa" (e sim, fiz uma referência a um dos filmes do Super Man...).
O sistema econômico em geral, aliado à globalização (principalmente no que diz respeito à informação), podem ser considerados os culpados, ou responsáveis, por essa nova forma de conduzir o tempo. São macro estruturas a nível de relação que se inserem de forma quase violenta naquilo que é privado, nas microestruturas, nas micro-relações. Mais uma vez, não estou dizendo nada novo.
No entanto, fica a questão: onde se insere o assunto iniciado aqui, que são os tão desejados finais de semana, que de felizes muito pouco têm? Tudo seria uma maravilha se as coisas funcionassem apenas a nível ontogenético cultural, ou seja, seguindo uma visão skinneriana, a nível individual e social. Seriamos completamente adaptados a esse sistema social que se engendra em nossas vidas, e problema nenhum seria diagnosticado. Mas ainda dentro da visão skinneriana, não somos apenas individuais e sociais. Somos biológicos, temos uma herança filogenética que dita formas pré-estruturais de funcionamento (tanto individuais quanto sociais). Ou seja, nosso "relógio biológico" não costuma andar tão rapidamente quanto o relógio da globalização e da informação. Prova disso é que ainda notamos essa rapidez com que o ano passa tão rapidamente.
Desejar que a semana passe rapidamente nada mais é do que dizer "Stop! Eu não estou conseguindo acompanhar esse ritmo!". E assim, desejamos com todas as nossas forças a chegada do Fim de Semana, que promete trazer consigo (promessa essa quase messiânica), de trazer o descanso e a alegria que não conseguimos desfrutar durante os dias úteis.
Assim, chega a sexta-feira, anunciante por excelência, da chegada do Sábado e do Domingo. Aqui sim eu consigo dizer que desfrutamos a alegria do Fim de Semana, pois a Sexta-feira é um dia de promessa, um dia de esperança. E a esperança costuma nos dopar, alcoolizar (metaforicamente e literalmente), nos trazendo a sensação da alegria perdida. Mas aqui surge a contradição: os Finais de Semana, via de regra, não cumprem o que prometeram. Um momento de reflexão para uns e de sensação para a maioria se iniciam, ambas dizendo a mesma coisa.
Desejamos tanto que o tempo passe rápido, que não notamos que ele já está mais rápido do que de costume, e quando nos damos conta desse desejo, eis que chega a crise existencial, que como eu disse, ou é sentida ou é refletida (as vezes, as duas coisas). Crise essa que demonstra a impotência que temos diante da vida.
O desejo de adiantar algo que já está adiantado traz mais depressa o fim inevitável, e o Fim de Semana costuma nos dizer isso, que nós de uma maneira completamente irracional, desejamos que o nosso fim venha mais depressa. Aqui já não é difícil de entender o porquê de não desfrutarmos da alegria do Final de Semana de forma verdadeira.

No final, nos damos conta de que o que desejamos nos dias úteis é uma utopia para quem é imortal, e não para nós meros mortais. Assim, maquiamos essa decepção existencial com a justificativa "estou de mau humor por que amanhã é segunda-feira". E eu digo que não, não estamos decepcionados por que amanhã é segunda-feira. Estamos decepcionados por que todos os dias são uma eterna Segunda-feira.

Once Upon a Time e a questão da dupla personalidade: uma introdução a um tema amplo

Seriados são uma paixão a qual eu nutro com muito afinco. Geralmente, quando começo a ver um seriado, não descanso até chegar ao último episódio já lançado. No entanto, nem sempre isso é possível, principalmente quando começo a assistir desde o começo, pois preciso conter minha ansiedade...
É o caso do seriado Once Upon a Time (Era uma vez, em português), que comecei a assistir no começo de 2012. Escrita por Edward Kitsis e Adam Horowitz, a série conta a história na qual os personagens dos contos são fadados a viver no mundo real após uma terrível maldição lançada pela Evil Queen/Regina Mills (Rainha Má). No nosso mundo, esses personagens vivem uma espécie de “sono existencial”, visto que não se lembram de suas vidas passadas e adotam novas personalidades, muitas vezes conflitantes com àquelas que eles possuíam no mundo dos Contos de Fadas (Fairy Tale Land).

Não pretendo fazer uma descrição detalhada aqui dessa série, mas fazer uma reflexão sobre a dupla personalidade que esses personagens possuem. Via de regra, cada episódio mostra fatos que ocorrem no nosso mundo atualmente, e acontecimentos que se passaram no mundo dos Contos de Fadas. Como disse, as personalidades são, geralmente conflitantes, o que pode causar um “nó” no cérebro do telespectador pouco assíduo dessa série.
Um foco possível a tomar é o caso da Snow White/Mary Margareth Blanchard. Nos fatos passados no mundo dos contos de fadas, Snow White se mostra como uma moça batalhadora, que luta pelo amor dela a qualquer custo, mas principalmente, foge das garras da Evil Queen. Ou seja, é uma moça que apesar de meiga, não faz o tipo e princesa que espera pacientemente pelo seu príncipe. Mary Margareth não deixa de ter certas características que sua alterego, Snow White, possui. Por exemplo, ambas são meigas e crentes na força do verdadeiro amor. Mas Mary Margareth guarda certas especificidades não compartilhadas por Snow.

A primeira diferença reside no caráter altamente passivo que Mary Margareth possui. Em Storybrooke (cidade que a Evil Queen trancafiou todos a partir da Maldição das Trevas), Mary é uma professora do Ensino Primário que não poucas vezes deve suportar a forma nada meiga de agir da Prefeita Regina Mills, que como disse, era a Evil Queen no mundo dos Contos de Fadas. Além disso, Mary não possui o acolhimento que Snow possuía no outro mundo. Por exemplo, seu Prince Charming se encontra em coma logo nos primeiros episódios e, em seguida, sua outra personalidade se mostra como um homem já casado com outra mulher. Sua melhor amiga em Fairy Tale Land, a Chapeuzinho, é em Storybrooke uma moça que dificilmente começaria uma amizade com o tipo de Mary, visto que Chapeuzinho (aqui chamada de Ruby) é uma moça pouco recatada, o oposto de Mary. Os anões também não mantém uma relação amistosa com Mary, sendo que o Zangado até a esnoba em um dos episódios (episódio esse que posso comentar em outra hora).
Ou seja, no mundo real Snow White é uma moça solitária, e isso influencia decisivamente sobre sua personalidade. Se em Fairy Tale Land, Snow sempre tinha suporte emocional, quer seja de seus amigos, quer seja de seus súditos que acreditavam em sua bondade, em Storybrooke Mary não tem o mesmo suporte emocional que antes possuía. É de se pensar que sem esse reforço social, a passividade de Snow viria à tona.
Isso certamente é um ponto de partida para explicar a diferença considerável entre as “duas” personagens. Snow White/Mary Margareth são um dos vários casos que podemos citar em um outro momento aqui do blog. Além disso, ainda quero analisar mais o caso da Snow, um dos personagens que mais gosto do seriado.

Vale dizer que Once Upon a Time está agora em sua terceira temporada, que nos trará uma viagem à Neverland, a terra do Peter Pan. Vale a pena assistir para quem gosta de releituras de contos de fadas. Além disso, o foco nas características psicológicas de cada personagem é um prato cheio para quem adora fazer análises.

Da "Ditadura da Felicidade", ou, do dia que nos tornamos vazios

Eis o primeiro texto do blog, iniciado hoje. Essa crônica que fiz foi postado em meu facebook no dia 16 de agosto de 2013. 

Dizem que chatos só fazem chatices. Tudo bem. Essa identificação social já foi por mim internalizada há muito tempo. Então lá vai mais uma...
Ultimamente vemos tantos sorrisos, tantas caras felizes, tantas fotos alegres e tantas frases de otimismo jogadas ao ar o tempo todo, que um viajante que esteve fora da Terra nos últimos 100 anos há de pensar que o ser humano finalmente descobriu o caminho da felicidade, ou algo como a “pedra filosofal da alegria plena”. Sua percepção só poderia ser essa, afinal se há algo difícil de ver por aí são outras expressões emocionais em nosso cotidiano, onde há apenas a alegria.
Mas esse mesmo viajante logo notaria certa estereotipia nesses comportamentos alegres. Seu pensamento poderia ser “bom, há algo errado aqui... mas talvez isso não seja um problema”, e assim poderia continuar sua viagem de reconhecimento. Após essa constatação, ele finalmente encontraria outras expressões emocionais, como raiva, tristeza, decepção e tantas outras. Seriam poucas, mas mesmo assim existiriam. Agora sim um problema seria constatado! Nosso viajante veria que esses poucos seres que se negam a entrar no estereótipo do “indivíduo alegre”, sofrem algo que seria definido como “A Ditadura da Felicidade”!
Mas peraí! Não é a vontade de todos a felicidade em si? Antes mesmo de ser uma vontade, não é um direito natural de todos os seres? A resposta é sim! Claro que sim! É essa a ideia! Mas em nenhum momento se perguntou como é esse estado de felicidade. Sabemos o que queremos, mas não saberemos reconhecer isso que queremos, caso ele já esteja entre nós. Ok, e onde entra essa “Ditadura da Felicidade”, que você falou, Ronald? Essa ditadura entra no momento em que nós definimos o que é ser feliz sem uma reflexão prévia. Numa cultura da aparência, o mero sorriso estampado no rosto, acompanhado de frases de otimismo jogadas ao vento, são a marca registrada daquilo que se considera o retrato da felicidade. E, utilizando aqui uma expressão muito usada por minha avó, “ai daquele” que ousar sair dessa regra. Das duas uma: ou é um ser digno de pena ou um ser digno de ódio.
“Ai Ronald, para você tudo tem que ser pensado, nada pode ser apenas sentido!” – Mas é exatamente o que estou dizendo: estamos numa época em que viver a grande gama de emoções que o ser humano possui é impedido. Não podemos sentir! Viver a tristeza em todas as suas formas! Viver a raiva! Viver o medo! Viver!
A obrigatoriedade de andar com o sorriso estampado no rosto tem impedido que alcancemos esse tal estado de felicidade, justamente por que esse estado não nega emoção alguma. Certamente não sei o que é ser feliz, assim como até hoje, poucos humanos em todas as épocas não descobriram. Desconfio de algumas personalidades históricas, mas só desconfio... Mas com certeza o “ser feliz” só pode ser alcançado com a vivência dessas emoções sem culpa, sem pensar no que “os outros vão pensar”. E assim surge a Ditadura da Felicidade, onde aqueles que se permitem sair de tal estereótipo são, digamos, escondidos debaixo do tapete. Isso por que eles esfregam na cara dos demais o quanto estamos vazios, e o quanto desejamos preencher tal vazio. Mas dizem que o que mais impede a mudança é a sensação de que ela está próxima, então continuemos assim.

No mais, só posso dizer que tal felicidade, tão procurada desde os gregos antigos, ainda não foi encontrada. Mas tenho meus palpites de quem realmente está a menos quilômetros de distância dela...

Uma breve Introdução

Introduções são sempre difíceis para mim. E assim, de uma forma bem "malandra", consigo introduzir um texto que demorei mais para iniciá-lo do que para desenvolvê-lo.
Quando me dei a tarefa de iniciar um blog, eu já havia refletido muito sobre a possibilidade. Pois afinal, sobre o que falar? Sobre o que conversar? Sobre o que refletir? Aliás, eu ia refletir sobre algo aqui? Falaria mal de alguém? Ou pura e simplesmente compartilharia coisas que eu vi na internet e "achei legal"?
Minha conclusão foi essa: por que não criar um blog que eu “desse conta” de falar sobre tudo? Sei qual é o pensamento que surgiu: ninguém consegue falar de tudo. E sim, devo concordar com essa possível resposta à minha pergunta. E seguindo esse pensamento que decidi abrir um blog, pois afinal, quem se dá ao trabalho de falar sobre tudo, não precisa se focar em nada. Tal atitude tem dois lados. Um é negativo, e o outro é positivo (pelo menos para mim).
A parte negativa diz respeito a pouca contribuição que eu poderei dar aos possíveis leitores. Não pretendo criar nada novo aqui, não pretendo revolucionar nada, e muito menos irei saciar o sadismo do leitor ao escrever aqui minhas loucuras e sofrimentos existenciais (apesar de que não está fora da lista textos que tratem dessa “faceta” minha). Ou seja, é um blog inútil no final das contas.
O lado positivo, e aqui reitero que a positividade é essencialmente direcionada a mim, é que não precisarei me limitar. Ao me propor escrever sobre apenas um tema, pouco me oferecerei em termos de aprendizado e reflexão possíveis outros temas que muito me somaria. Ou seja, ao falar sobre tudo, poderei me dedicar a qualquer loucura que venha surgir nessa cabecinha pouco comunicativa, mas muito barulhenta.
Bom, terminando minhas considerações, devo especificar o que é tudo para mim. Essa é uma questão muito filosófica, pois quando nos referimos a “tudo”, estamos referenciando apenas uma parcela desse grande “todo” que se chama Universo. Não tenho habilidades de falar sobre tudo isso, o que gera uma contradição imensa: quero falar sobre tudo, me propus falar sobre tudo, mas não falarei sobre tudo.
Notem, então, que quando alguém diz que “vai falar sobre tudo”, não necessariamente fará isso. É uma forma de dizer “não vou me limitar a priori, me limitarei no decorrer do meu discurso”. Esse rodeio todo que fiz foi uma forma confusa de dizer que esse Blog não tem um tema definido.
Mas direcionamentos são necessários, e muito úteis. Assim cito aqui que meu objetivo é treinar minha escrita. Geralmente leio muito, mas escrevo pouco. Escrever sobre o que leio e assisto é algo muito útil a mim.
Escreverei crônicas sobre o meu cotidiano (global, regional, local e pessoal), descrevendo pensamentos meus diante das coisas mais banais que ocorrem e, seguindo o ensinamento de um filósofo que costumo ler bastante (o Paulo Ghiraldelli Jr.), desbanalizar esse banal. Esse meu primeiro desejo meu já me direciona à outra paixão que tenho, que é a Filosofia. E cito paixão, pois conheço pouco sobre essa tão vasta e intrigante área do conhecimento.
Dois possíveis direcionamentos foram dados, mas não são os únicos. Curso Psicologia, outra área que amo muito, mas conheço pouco. Escrever sobre o ser humanos, suas motivações, seus desejos e suas angustias sempre me pareceu algo muito excitante. Além disso, conhecimento técnico sobre a área é algo muito importante ao meu futuro profissional, de forma que é uma das minhas pretensões escrever amplamente sobre a parte mais técnica da Psicologia (leis, princípios, teorias, abordagens e afins).
Como já deixei implícito, ler é uma das minhas paixões, e eu gostaria muito de compartilhar isso com alguém. Não sou um expert da literatura, mas sou um admirador, e isso é fato. Animes (uma paixão recente), filmes e séries também são interesse meus, e pretendo escrever sobre o que assisto.
Assim, concluo o que é possível esperar das minhas escritas. Mas deixo claro que essas divisões que fiz são meramente didáticas. Ou seja, nada me impede que eu não as misture no decorrer das postagens. Espero que esse blog seja, de fato, algo interessante, já que sua futura inutilidade é algo que deixei bem claro no início. Vejamos no que mais essa loucura minha vai me levar...