sábado, 7 de setembro de 2013

A Bondade dos Anjos

É muito engraçado como o apelido "anjo" age como um combustível eficaz em qualquer relacionamento. E não é para menos. Anjos são, de acordo com nossa visão pré-concebida, seres de bondade infinita, mas que ao contrário de Deus, devem carregar consigo a humildade de se autodeclararem "menos", mesmo diante de tantas qualidades que guardam em si. E esse nome, carregado por toda essa visão, é aceito com muita felicidade por quem recebe esse apelido.
O sentimento narcísico decorrente dessa nomenclatura dada é enorme, sendo que eu particularmente considero difícil existir alguém que não se satisfaça com os seguintes adjetivos introjetados em si: belo, bondoso, inteligente, humilde, perfeito...

E eis que surge a essência do sentimento gerado por esse nome: a perfeição. Porém, aqui coloco a perfeição somada com uma característica a mais, que é a humildade. Mas por quê? Deus, como já deixei implícito, não necessita ser humilde. Como “Senhor de toda a criação”, é dispensável carregar para si o adjetivo de “humilde”, cabendo a nós, meros mortais, esconder (ou nos livrarmos logo) de tudo aquilo que chamamos de “orgulho”. Em toda a mitologia cristã, é fácil reconhecer o futuro de quem ousa ser orgulhoso, característica essa que apenas Deus pode ter. Tal assunto renderia outro texto, mas o que quero colocar aqui é a dicotomia que separou homens de deuses, mas que criou um terceiro elemento, que são os anjos. Como orgulho era uma qualidade que homens não poderiam ter, o que lhes restou foi ficar com o seu equivalente negativo, que é a humildade. Humildade e nada mais, eis a única qualidade dos seres humanos.
Mas anjos são mais do que homens, e menos do que deuses. Como criar para esta classe características únicas que a distinguiria das demais? A resposta é simples: não se cria características novas; usa-se qualidades já existentes (conhecidas), mistura-as e pronto! Temos um novo ser. Mas olha a armadilha que criamos: juntamos qualidades próprias de Deus e unimos com a única qualidade que restou aos seres humanos, que é a humildade. Diante disso, ultrapassamos o nosso próprio ideal de perfeição. Por isso, não desejamos mais ser “deuses”, queremos ser os “anjos” da vida de alguém, queremos ultrapassar a própria perfeição!
Talvez seja por isso que namorados e namoradas amam declarar seus amados como os “anjos de sua vida”, pois é a forma mais sutil, eficaz e igualmente poderosa de demonstrar os sentimentos elevados que se tem por outra pessoa. Mas cuidado! Anjos são seres maravilhosos sim. No entanto, sua magnificência não é conquistada, é dada, vem de fora.
Das coisas que mais temo, a bondade natural seria certamente um dos primeiros itens, pois assim como ocorreu com um certo anjo, a raiva ao descobrir que, mesmo diante de todas as qualidades, algo “maior” está acima dessa suposta perfeição pode criar verdadeiros monstros cruéis em busca do narcisismo perdido.
Por isso, penso que é bem melhor continuar sendo um ser humano de valores ora conquistados, ora rejeitados, do que ser algo superficial, cujas qualidades são dadas e, a qualquer momento, podem transformar nossas vidas num inferno...*

*O trocadilho foi intencional

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