domingo, 1 de setembro de 2013

Da "Ditadura da Felicidade", ou, do dia que nos tornamos vazios

Eis o primeiro texto do blog, iniciado hoje. Essa crônica que fiz foi postado em meu facebook no dia 16 de agosto de 2013. 

Dizem que chatos só fazem chatices. Tudo bem. Essa identificação social já foi por mim internalizada há muito tempo. Então lá vai mais uma...
Ultimamente vemos tantos sorrisos, tantas caras felizes, tantas fotos alegres e tantas frases de otimismo jogadas ao ar o tempo todo, que um viajante que esteve fora da Terra nos últimos 100 anos há de pensar que o ser humano finalmente descobriu o caminho da felicidade, ou algo como a “pedra filosofal da alegria plena”. Sua percepção só poderia ser essa, afinal se há algo difícil de ver por aí são outras expressões emocionais em nosso cotidiano, onde há apenas a alegria.
Mas esse mesmo viajante logo notaria certa estereotipia nesses comportamentos alegres. Seu pensamento poderia ser “bom, há algo errado aqui... mas talvez isso não seja um problema”, e assim poderia continuar sua viagem de reconhecimento. Após essa constatação, ele finalmente encontraria outras expressões emocionais, como raiva, tristeza, decepção e tantas outras. Seriam poucas, mas mesmo assim existiriam. Agora sim um problema seria constatado! Nosso viajante veria que esses poucos seres que se negam a entrar no estereótipo do “indivíduo alegre”, sofrem algo que seria definido como “A Ditadura da Felicidade”!
Mas peraí! Não é a vontade de todos a felicidade em si? Antes mesmo de ser uma vontade, não é um direito natural de todos os seres? A resposta é sim! Claro que sim! É essa a ideia! Mas em nenhum momento se perguntou como é esse estado de felicidade. Sabemos o que queremos, mas não saberemos reconhecer isso que queremos, caso ele já esteja entre nós. Ok, e onde entra essa “Ditadura da Felicidade”, que você falou, Ronald? Essa ditadura entra no momento em que nós definimos o que é ser feliz sem uma reflexão prévia. Numa cultura da aparência, o mero sorriso estampado no rosto, acompanhado de frases de otimismo jogadas ao vento, são a marca registrada daquilo que se considera o retrato da felicidade. E, utilizando aqui uma expressão muito usada por minha avó, “ai daquele” que ousar sair dessa regra. Das duas uma: ou é um ser digno de pena ou um ser digno de ódio.
“Ai Ronald, para você tudo tem que ser pensado, nada pode ser apenas sentido!” – Mas é exatamente o que estou dizendo: estamos numa época em que viver a grande gama de emoções que o ser humano possui é impedido. Não podemos sentir! Viver a tristeza em todas as suas formas! Viver a raiva! Viver o medo! Viver!
A obrigatoriedade de andar com o sorriso estampado no rosto tem impedido que alcancemos esse tal estado de felicidade, justamente por que esse estado não nega emoção alguma. Certamente não sei o que é ser feliz, assim como até hoje, poucos humanos em todas as épocas não descobriram. Desconfio de algumas personalidades históricas, mas só desconfio... Mas com certeza o “ser feliz” só pode ser alcançado com a vivência dessas emoções sem culpa, sem pensar no que “os outros vão pensar”. E assim surge a Ditadura da Felicidade, onde aqueles que se permitem sair de tal estereótipo são, digamos, escondidos debaixo do tapete. Isso por que eles esfregam na cara dos demais o quanto estamos vazios, e o quanto desejamos preencher tal vazio. Mas dizem que o que mais impede a mudança é a sensação de que ela está próxima, então continuemos assim.

No mais, só posso dizer que tal felicidade, tão procurada desde os gregos antigos, ainda não foi encontrada. Mas tenho meus palpites de quem realmente está a menos quilômetros de distância dela...

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