Sou uma pessoa amorosa.
Sim, acreditem, sou extremamente amoroso.
Sou de uma linhagem já ultrapassada de românticos
sonhadores.
Sou uma relíquia de um tempo que nem sequer vivi.
Mas sou, antes de tudo, um frustrado.
Um frustrado, pois desde cedo descobri que os livros que eu
lia eram mentirosos.
Um frustrado, pois notei que o mundo em que eu vivia era
desprezível.
Um frustrado, pois a cada vez que ofereci meu amor, o mesmo
foi negado, rejeitado e desprezado.
Hoje deixei a frustração de lado. Perdi minha fé no homem.
Minha filosofia de vida, que diz ser o homem fruto de sua
história, é no fundo falsa.
Falsa por que duvido que o ser humano melhore.
Falsa por que sei que nada melhorará...
Mas o que queria eu? Que todos se jogassem aos meus pés e
fizessem o que eu bem entendesse?
Talvez. E diante desse talvez, a razão resolveu dar lições à
emoção.
A razão ensinou à emoção que a tristeza é um sentimento
terrível e enfraquecedor.
A razão ensinou à emoção que nada está necessariamente, em
meu controle.
A razão ensinou, enfim, que um amor dado de forma tão
benevolente não pode ser oferecido pela segunda vez.
Tudo bem. Decidi aceitar os ensinamentos. Do amor para a frustração.
Da frustração para a tristeza. Da tristeza para o ódio. Do ódio para o
desprezo.
Aprendi que amor é algo muito bonito para ser dado à seres
humanos.
Aprendi que o pecado original é o menor dos pecados do ser
humano.
Aprendi que onde há muita moral, há muita maldade.
Hoje, mudei finalmente. Em nada lembro o garoto risonho de
outrora.
Ou quase...
Resolvi oferecer o amor que tenho à inocência de um leão
selvagem.
À flor que desabrocha.
À vivacidade de uma criança.
À sabedoria de um idoso.
Se amo? Sim, claro. Mas aprendi que tal amor é belo demais
para ser jogado à lama.
Hoje sou imbatível. Ou quase.
Hoje sou o terror dos terroristas.
Hoje sou o inferno dos pecadores.
Hoje eu sou o medo dos amedrontadores.
Quase um justiceiro. Quase um anjo negro. Quase...
Mas sorriso ainda está lá, escondido.
Sou hoje um sereno caminhante por entre as ruas dos
agonizantes.
Sou um mero espectador, que com o poder do silêncio, nega a
dar a mão ao pobre pecador.
Sou um fiel companheiro do tempo, só que mais debochado,
risonho diante da desgraça daqueles que riem dos bem-aventurados.
Sou, enfim, um ser desprezível. Não!
Sou o desprezo em pessoa.
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