sábado, 30 de novembro de 2013

“A Psicologia como o estudo de interações” de João Claudio Todorov – uma introdução às definições sobre o que é a Psicologia e a Análise do Comportamento

O texto resenhado de hoje é de autoria de João Cláudio Todorov. Todorov possui licenciatura em Psicologia pela Universidade de São Paulo (1963) e doutorado em Psicologia pela Arizona State University (1969). É Professor Emérito da Universidade de Brasília, e foi Reitor (1993-1997), Vice-Reitor (1985-1989) e Decano de Pesquisa e Pós-Graduação (1985) da Universidade de Brasília. O presente artigo foi publicado por ele no 23º volume da revista Psicologia: teoria e pesquisa, em 2007, e tem por objetivos analisar os problemas existentes nas várias de definições de Psicologia e expor as vantagens, do ponto de vista da Análise do Comportamento, em definir a Psicologia como o estudo de interações organismo-ambiente.

Todorov (2007) inicia seu texto demonstrando a dificuldade que a definição de Psicologia traz a quem ousa defini-la. Quer a caracterize como a ciência da vida mental, quer a defina como uma ciência do comportamento, em ambas as definições só teremos a necessidade de mais explicações.
Indiferentes às deficiências das definições mencionadas, há os que se preocupam com uma definição que contente a mentalistas e a comportamentalistas. Para estes, a Psicologia seria o estudo do comportamento e da vida mental. Contudo, a reunião em uma mesma frase de dois termos indefinidos não melhora uma definição (TODOROV, 2007, p. 57).
O objetivo de Todorov é, a partir de um viés analítico comportamental, dar uma definição que caracterize também o trabalho da Psicologia como um todo. Para Todorov, a Psicologia é uma ciência que estuda as interações entre organismo e ambiente. Como organismo escolhido como objeto de estudo, a Psicologia escolheu o homem, mesmo que ela se utilize de outros animais para teorizar e estudar o comportamento humano.
Também é papel do psicólogo estudar a interação do homem com o ambiente. Mas não são todas as interações que Todorov (2007) considera como papel da Psicologia investigá-las. Assim, ele exclui as interações que se referem a partes do organismo, sendo estas parte das investigações que a Biologia deve tomar para si. Também exclui as interações que lidam com grupos de indivíduos como unidades, tal qual as Ciências Sociais. No entanto, as fronteiras entre as áreas não são rígidas, podendo ser tranquilamente sobrepostas, a ponto de surgir áreas próprias de estudo, como a Psicofisiologia e a Psicologia Social. “[...] a passagem da Psicologia para a Biologia ou para as ciências sociais é muitas vezes questão de convencionar-se limites ou de não se preocupar muito com eles” (TODOROV, 2007, p. 58).
Há, no entanto, de se tomar como verdade um erro de pensamento comum, que é a questão do determinismo total. Todorov enfatiza que, tomar a Psicologia como um estudo das interações não torna o homem nem como um ser acima da natureza (divinizado, especial), e nem como um robô totalmente determinado pela natureza. “Os homens agem sobre o mundo, modificam-no e, por sua vez, são modificados pelas conseqüências de sua ação” (TODOROV, 2007, p. 58). Dito isso, o autor inicia então suas considerações sobre os níveis de interação entre organismo e ambiente, com foco nas dicotomias “interno/externo”.
Para Todorov (2007), homem consegue se relacionar com o ambiente externo de formas diretas e indiretas. Diretamente, nosso organismo se utiliza de atributos físicos para agir no mundo físico. Por exemplo, estende a mão para buscar um copo de água. Por outro lado, o organismo pode se relacionar com o mundo através de formas indiretas, como a fala (comportamento verbal). Nesse mesmo exemplo, o organismo conseguiria o copo de água através de um pedido verbal “me dê um copo de água”.
O trecho citado ilustra a divisão do ambiente externo em físico e social. As interações do organismo com seu ambiente social não são de natureza diferente daquelas interações com seu ambiente físico; são apenas mais difíceis de descrever. Essa dificuldade, entretanto, parece ser responsável pelo desenvolvimento independente de diversas áreas da Psicologia e pelas tentativas de desenvolver-se diferentes conceitos e princípios (TODOROV, 2007, p. 58).
Há também o ambiente interno, que pode ser considerado como o ambiente biológico e/ou histórico. Todorov ressalta, no entanto, que tais ambientes são indissociáveis. Não dá para se pensar em ambiente físico, social, histórico e biológico de maneiras separadas. Quando falamos de ambiente interno biológico, estamos afirmando que modificações internas do organismo participam das interações entre o organismo e o ambiente “[...] tanto como estímulos que controlam respostas que os antecedem ou os seguem, quanto como respostas controladas pelos estímulos componentes da interação, como veremos mais adiante” (TODOROV, 2007, p. 59).
Já no que diz respeito ao ambiente interno histórico, as teorias geralmente recorrem a dois tipos diferentes de explicação. Na primeira explicação imperam as teorias defensoras de algum aparato mental interno, tais quais as diversas teorias psicanalíticas apóiam. De outro lado, há as explicações “[...] que referem-se a contingências passadas, observadas ou hipotéticas, como nas também variadas versões atuais do comportamentalismo” (TODOROV, 2007, p. 59).
A decomposição do conceito de ambiente em externo, físico ou social, e interno, biológico ou histórico, é apenas um recurso de análise útil para entender-se a fragmentação da Psicologia em diversos campos e para apontar os diversos fatores que, indissociáveis, participam das interações estudadas pelos psicólogos. Sem a decomposição necessária para a análise, o todo é ininteligível; por outro lado, a ênfase exclusiva nas partes pode levar a um conhecimento não-relacionado ao todo. O jogo constante de ir e vir, de atentar para a interrelação das partes na composição do todo é essencial para o entendimento das interações organismo-ambiente (TODOROV, 2007, p. 59).
A partir disso, Todorov (2007) enfatiza a interdependência entre os conceitos de comportamento e ambiente. Apesar de salientar que não se sabe exatamente hoje o que é e o que não é comportamento, sabemos hoje que comportamento não existe sem ambiente, e descrever o ambiente sem citar o comportamento é algo inútil para um cientista do comportamento. Temos assim uma noção de causa e efeito no que se refere à relação entre o ambiente e o comportamento.
Devemos ao filósofo David Hume (1711-1776) a noção de causa e efeito, onde causa é a mudança numa variável independente, e efeito é uma mudança numa variável dependente. Na questão do comportamento, entretanto, temos como fator relevante as variáveis de contexto, que influenciam a ocorrência ou não do efeito após a ocorrência da causa. Estamos falando aqui de antecedentes históricos. “Contexto não se refere apenas a características atuais do ambiente externo” (TODOROV, 2007, p. 60). Ao dizer isso, Todorov faz referência ao teórico Staddom, que de acordo com ele, estabeleceu a noção de variáveis do contexto
Dessa forma, Todorov conclui seu artigo demonstrando o conceito de contingência e a importância do psicólogo buscar em sua atividade, as contingências que mantém determinado comportamento. “Na análise do comportamento, o termo contingência é empregado para se referir a regras que especificam relações entre eventos ambientais ou entre comportamento e eventos ambientais” (TODOROV, 2007, p. 60).
O artigo é bem claro quanto ao seu objetivo: definir a Psicologia como o estudo das interações. Só que mais do que isso, Todorov se propõe a fazer uma tarefa que poucos ousam, que é dar uma definição geral à Psicologia a partir de considerações da Análise do Comportamento. Num momento em que a Análise do Comportamento é posta de lado quando as diversas Psicologias definem essa área como a “Ciência da Subjetividade”, Todorov parece ter conseguido colocar todas as abordagens numa única definição sem, contudo, excluir a Análise do Comportamento.

Referência

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